The disheartened eye
Mrs. Fang carries the name of its protagonist as its title for more than one reason. The opening shots give away the most obvious of them: as we see the main character moving around her house, the film promptly announces itself as a portrait of her. However, after the prologue, a cut tells her a year has passed, and Mrs. Fang’s body has been almost completely immobilized by Alzheimer, tying her to a bed. The camera lingers on her face, her mouth agape like Lessing’s Laocoon, and the only parts of her body that tremble and move are her eyes. A voice in the background says that she just stays there and stares.
Mrs. Fang’s close-up becomes a mirror. As the camera trembles, surveying her face, we are suddenly made aware of an unexpected kinship: the commentary about her state could apply just as well to Wang Bing’s camera. The director’s strictly observational approach reflects the condition of the film’s main character: Mrs. Fang carries her name not only because it is about her, but because it is her.
With the exception of a couple Godot-like interludes in which some of the men in the family go fishing on a lake nearby, the camera stays in that room, focused on Mrs. Fang’s body, as a theater of premature wake takes place around them. Sometimes, her relatives talk about her as if she was not even there. But, again, the same could be said about the camera. As they discuss her condition in front of her, paying little attention to the fact that she might be able to hear everything they say, the mirror reflects something else: aren’t we also that unacknowledged presence, tied to our seats, staring into that room?
While artists as diverse as David Lynch, Pipilotti Rist, Andy Warhol, and Apichatpong Weerasethakul have investigated in their work the similarity between spectatorship and dreaming, in Mrs. Fang Wang Bing turns to the purging of a person’s last moments (although death itself is avoided by the film, keeping her last breaths private) to define the cinematic experience as a limbo between life and death. Aestheticizing death doesn’t come without a price, but as one sits there in the dark, staring into the minuscule spasms of life that make a frozen face vibrate, the very vocation of the cinematic experience as an often-metaphorical encounter with death seems to achieve a new level of clarity, of physical awareness. With Mrs. Fang, Wang Bing pushes observational documentary beyond the perverse and facile metaphor of the fly on the wall; we are, in fact, the moribund gaze, the disheartened eye, the cocooned spirit still trapped in a room.
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O olhar desenganado
Mrs. Fang assume o nome de sua protagonista por mais de uma razão. Os planos que abrem o filme oferecem a justificativa mais superficial: ao acompanharmos a personagem principal trocando passos em sua casa, o filme se anuncia como um retrato. No entanto, com o fim do prólogo, um corte salta o ano, e o corpo da Sra. Fang já foi quase totalmente paralisado pelo Alzheimer, confinando-a à cama. A câmera se detém em seu rosto, sua boca aberta como o Laocoon de Lessing, e as únicas partes de seu corpo que reagem são seus olhos. Fora de quadro, uma voz diz que tudo que ela faz é ficar parada, olhando.
O close da Sra. Fang se revela um espelho. Enquanto a câmera tremula, circunvagando os detalhes de seu rosto, somos subitamente tomados por uma estranha paridade: o comentário sobre seu estado se aplica igualmente à câmera de Wang Bing. A abordagem estritamente observacional do documentarista reflete a condição da personagem principal: Mrs. Fang carrega o seu nome não só por ser um filme sobre ela, mas por ser como ela.
Com a exceção de alguns interlúdios à Godot em que alguns dos homens da família vão pescar em um lago ao lado da casa, a câmera se mantém naquele quarto, dedicando toda a sua atenção ao corpo de Mrs. Fang, enquanto a teatralidade de um velório prematuro se instala ao seu redor. Por vezes, seus parentes falam sobre ela como se ela já não estivesse lá. Mas, novamente, o mesmo poderia ser dito sobre a câmera. Enquanto eles discutem seu prognóstico em sua presença, não parecendo se importar com a possibilidade de que ela escute o que eles dizem, o espelho reflete outra imagem: não seríamos, nós, também essa presença ignorada, presos aos nossos assentos, olhando para aquele quarto?
Enquanto artistas tão distintos quanto David Lynch, Pipilotti Rist, Andy Warhol e Apichatpong Weerasethakul investigaram os cruzamentos possíveis entre a experiência do espectador e o sonho, em Mrs. Fang Wang Bing se volta à purgação dos últimos momentos de uma pessoa (embora a morte propriamente seja evitada pelo filme, guardando privacidade a seus últimos suspiros) para definir a experiência do cinema como um limbo entre vida e morte. A estetização da morte cobra um preço, mas no escuro da sala, em busca dos minúsculos espasmos de vida que vibram um rosto congelado, a vocação da experiência cinematográfica como um encontro com a morte (frequentemente metafórica) atinge um novo patamar de clareza, de confirmação corporal. Com Mrs Fang, Wang Bing empurra o documentário de observação além da metáfora conveniente e perversa da mosca na parede; nós somos, na verdade, a visão moribunda, o olhar desenganado, o espírito encasulado ainda preso entre quatro paredes.
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